Saí de Portugal com o espírito completamente contaminado, cheio de emoções transmitidas sobre o Carnaval da Bahia.
Relatos emocionantes sobre uma festa gigantesca nas ruas, com a duração de uma semana, com milhões de pessoas, com trios eléctricos, com os melhores artistas brasileiros, com mulheres bonitas, com muita alegria e loucura, encheram-me a mente de imagens e já só pensava numa forma de lá ir parar.
Este foi o resultado da lavagem cerebral, não intencional, provocada por um colega de trabalho, obviamente brasileiro!
Já em São Paulo, dei umas surfadas na ciber-realidade, à procura de voos baratos para Salvador. Depressa desanimei! Mais valia deixar o meu espírito sofrer da contaminação, até que os anti-corpos conseguíssem sair vitoriosos, do que comprar o medicamento caríssimo para o qual não conseguía encontrar genérico.
Então, quando já não tinha a mínima esperança de tirar a prova dos nove, e verificar pessoalmente se os relatos eram verdadeiros, eis que surge uma oportunidade de trabalho em Salvador, mesmo na semana do Carnaval!
O Universo é mesmo fantástico, e a Lei da Atracção a mais sublime das suas leis.
"Sorria, você está na Bahia!"
Foi este o slogan que me deu as boas vindas no aeroporto.
Depois de apanhar a mala, logo me ofereceram uma fitinha. "Lembrança do Senhor do Bonfim da Bahia", dizia. Depois de tudo o que estava a acontecer, ainda tinha direito a pedir desejos? Pois bem, assim foi.
"- Não podes tirar a fitinha até ela cair, ou os teus desejos não se realizarão. Não podes contar a ninguém os teus desejos. Podes pedir até 3 desejos. Deve ser dado um nó para cada desejo." - foram estas as palavras do camarada que fez a cortesia de me ir buscar ao aeroporto.
Há cada coisa! Sem nada dizer, deram-me tantos nós na fitinha, como os desejos que pedi. Só podia ser um bom presságio.
Depois do almoço, fomos comprar os abadás - t-shirts de manga caviada, que são os bilhetes para o Carnaval de Salvador.
Cada bloco e camarote tem o seu próprio abadá, um diferente para cada dia da folia.
Tinha feito o trabalho de casa, e tinha já algumas ideias sobre os blocos em que queria sair. O de bloco de Terça-feira foi de fácil escolha: Bloco Skol D+, com Fat Boy Slim e David Guetta.
Neste primeiro dia, o destino quis que acabasse por me estrear no Carnaval sozinho. Então, para apalpar terreno, decidi ir para um camarote com varanda para o percurso Barra/Ondina (marginal de Salvador da Bahia). Mal entrei fui directo à varanda. A vista emocionou-me... Na marginal, na praia, havia gente por todo o lado. Todos animados, a dançar e festejar ao som da música. Que visão, que festão!
No mesmo instante, decidi que no dia seguinte era na rua, onde estava a verdadeira animação, que queria estar.
Assim foi... No dia seguinte, acordei pouco antes do meio-dia, e fui à procura de um Abadá. Depois de um estudo de mercado cuidadoso entre os cambistas, comprei o abadá para o bloco da Coruja (Ivete Sangalo).
Os blocos consistem de 1 trio eléctrico (camião com palco montado na cobertura para a banda actuar, e sistema de som a toda a volta), e um camião de apoio (com bar, quartos de banho, e primeiros socorros). Uma corda delimita a área do bloco que envolve os dois camiões, segurada por inúmeros cordeiros, rapazes novos que seguram a corda e asseguram que ninguém sem abadá entra no bloco. Dentro do bloco, espalhados, vários seguranças vigiam os foliões, e escoltam para fora do bloco vendedores de bebida ambulante, ou infiltrados sem abadá.
Entre o trio eléctrico e o camião de apoio, ao longo de todo o percurso, estavam dois bares ambulantes, carregados de bebida e refrigerados com kilos gelo. Todos os bares iam sendo estrategicamente reabastecidos ao longo do percurso.
Quanto à segurança, a partir de inúmeros postos de vigia, localizados estrategicamente e elevados acima da multidão, a polícia militar assegurava a segurança da festa. Com milhões de pessoas nas ruas, tudo dava provas de ter sido pensado, e a logística preparada ao pormenor.
Nota 10 para a organização.
O percurso durou 6 horas. A Ivete, incansável, manteve a "galera" sempre em alta.
Milhões de pessoas nas ruas, todas a curtir a festa... foram momentos indescritíveis.
Precisei de uns valentes beliscões para acreditar que tamanha festa seria possível!
Muito calor humano, animação no máximo, boa música... tudo perfeito.
O Carnaval da Bahia não é para fracos. É preciso espírito e muita energia. No final dos meus 3 dias consecutivos de festa, só tinha uma ideia em mente: voltar no próximo ano, de preferência com um grupo de amigos.